A atipicidade dos delitos cometidos na internet
Mário Antônio Lobato de
Paiva
Assessor da Organização
Mundial de Direito e Informática
Presidente da Comissão de
estudos em Direito da Informática da OAB/PA
Membro da Federação
Iberoamericana de Associações de Direito e Informática
Membro da Associação de
Direito e Informática do Chile
Membro do Instituto
Brasileiro de Política e Direito da Informática
Membro do Instituto
Brasileiro de Direito Eletrônico
E-mail: malp@interconect.com.br
Sumário:
I- Intróito; II- Sentença Argentina; III- Situação nacional; IV- Tendência
mundial; V- Conclusão; VI- Bibliografia
I-
Intróito
Em recente projeto que estamos desenvolvendo com
organizações internacionais como o Instituto de Investigación para
Ficamos de certa
forma assustados com a decisão apesar de termos alertado em artigo publicado
intitulado “Delitos Virtuais” sobre a necessidade da formulação e promulgação
de leis que visem dar tipificação e punição a esses delitos. Sendo assim
resolvemos comentar o julgado argentino para demonstrar o perigo legal que
estamos correndo.
II- Sentença Argentina
Na
sentença publicada no site http://www.lexpenal.com.ar
o juiz federal Sergio Gabriel Torres na parte que aborda a qualificação penal
relata que os réus violaram o sistema da página web da Suprema Corte de Justiça da Nação substituindo-a por outra
alusiva ao aniversário de falecimento do jornalista José Luis Cabazes e que,
teoricamente, implicaria nas sansões do artigo 183 do Código Penal Argentino
com a agravante do artigo 184 inciso 5º do mesmo corpo legal.
Entendeu
o juiz que os artigos referem-se especificamente a ataques a materialidade,
utilidade ou disponibilidade de coisas encontrando com isso obstáculo no
enquadramento da conduta em epígrafe como crime o que culmina na atipicidade do
feito sob julgamento. Para ele não é possível considerar a página web da Corte Suprema de Justiça da
Nação, como uma coisa, nos termos em
que esta deve ser entendida. “Coisa” definida no artigo 2311 do Código Civil da
Nação são objetos materiais suscetíveis de ter um valor.
Sendo
assim, a página web por sua natureza
não é um objeto corpóreo, nem pode ser detectado materialmente e adverte ainda
que o país se encontra em um claro vácuo legal somente com previsões em
projetos e anteprojetos de lei que tentam criar uma figura penal similar ao de
dano e tendo como objeto não mais a “coisa”e sim dados ou sistemas informáticos
O
juiz destaca que uma interpretação extensiva do conceito de coisa, ao ponto de
permitir inclusão da página web
dentro do mesmo tipo legal compreenderia em uma acepção forçada que implicaria
em claro menoscabo ao princípio da legalidade estabelecido no artigo 18 da
Constituição Nacional da Argentina.
Por
fim, conclui o magistrado que o fato não constitui crime e que atualmente a
legislação em vigor não permite sansão penal uma vez que estes tipos de delitos
não tem enquadramento legal em nenhuma figura penal prevista no Código Penal
Argentino da Nação e nem mesmo nas leis complementares.
III- Situação nacional
O resumo da
sentença proferida pelo juiz argentino demonstra o perigo que estamos passando e
a falta de estabilidade legal que vivemos levando o cidadão a total insegurança
e desproteção jurídica que pode levar a sociedade a ter sérios prejuízos, sem
falar na intranqüilidade permanente que pode ser e esta sendo gerada pela falte
de legislação.
Uma das questões
que mais provocam perplexidade é justamente, a que diz respeito a punição dos
delitos cometidos pela via eletrônica. A leitura de alguns artigos e livros
sobre o assunto refletem a imaturidade intelectual em que nos encontramos pois
nem sequer sabemos se há possibilidade de punir ou não este tipo de crime.
Autores apontam
algumas premissas legais e doutrinárias tradicionais que não possibilitam a
aplicação da legislação penal em condutas delituosas cometidas através de um
computador. O primeiro argumento é baseado no princípio da reserva legal que
obriga que a legislação tipifique determinado fato como criminoso, uma vez que
sem lei, não há crime. (art. 1º do CPP e 5º, XXXIX da CF)
Além disso a
doutrina tradicional na área penal é majoritária ao dizer que não é possível a
construção de interpretações extensivas e analógicas (salvo exceção), muito
menos se estas trouxerem considerações que venham a trazer prejuízo no
julgamento do acusado. A analogia é aceita portanto, apenas in bonam partem e mesmo assim com sérias
restrições feitas pela doutrina e jurisprudência conforme permissão legal do
artigo 3º.Código de Processo Penal. Levando em consideração essas afirmações
podermos chegar a conclusão de que os crimes chamados virtuais são atípicos e não
poderão ser punidos com base na legislação penal vigente.
A corrente que
defende a punição baseia-se no fato de que os crimes praticados pela via
eletrônica são os mesmos tratados pelo Código Penal, com a peculiaridade de
serem apenas versões modernas dos tipos, ou seja, a modificação ocorreria
apenas no modus operandi e portanto
não teria o condão de mudar o tipo penal que enseja punição penal.
A nosso ver
nenhuma das afirmações traz segurança suficiente para o julgamento e é por isso
que devemos desenvolver mais institutos que visem tipificar estas figuras
delituosas viabilizando uma correta e justa aplicação do Direito Penal. Cabe
ainda o estudo do direito alienígena de alguns países que tenham estudos mais
avançados sobre o assunto.
IV- Tendência mundial
Podemos perceber
a nível mundial duas tendências. A primeira delas é a de adoção da
interpretação extensiva como forma mais adequada de abarcar os delitos
provenientes das relações virtuais e a segunda é a promulgação de leis
específicas para combate e punição desses tipos de delitos como é o caso da Alemanha, que 1986 promulgou lei contra
a criminalidade econômica que contempla os delitos de espionagem e falsificação
de dados e a fraude eletrônica; da Austria na lei de reforma do Código
Penal de 22 de dezembro de 1987 que prevê os delitos de destruição de dados
(art 126) e fraude eletrônica (art. 148); da França na lei n 88-19 de 05 de janeiro de 1988 dispõe sobre o
acesso fraudulento a sistema de elaboração de dados (462-2), sabotagem (462-3),
destruição de dados (462-4); falsificação de documentos eletrônicos (462-5) e
uso de documentos informatizados falsos (462-6) e; dos Estados Unidos com a adoção de Ata Federal de Abuso Computacional
que modificou a Ata de Fraude e Abuso Computacional de 1986 direcionada a atos
de transmissão de vírus.
V- Conclusão
Diante do
apresentado podemos perceber que estamos passando por um processo de mudança e
evolução mundial que deve ser acompanhado pelo estudioso da área jurídica que,
de maneira alguma, poderá ficar alheio aos desafios que a Sociedade
Informatizada impõe. Não devemos, portanto, medir esforços para desenvolver
respostas coerentes, gerar modelos de conhecimento, métodos de análises
inovadores que alcancem fórmulas que permitam um correto e justo desenvolvimento
da Justiça Penal.
A solução passa
necessariamente pela criação de leis específicas que venham trazer tipicidade a
essas condutas perpetradas pelo uso das novas tecnologias acompanhadas de
sansões penais específicas que coíbam a prática do chamados delitos virtuais
que podem causar graves danos a comunidade.
Vale ressaltar
por fim que estes tipos de crimes não fazem mais parte de nossa imaginação ou
de um suposto futuro e sim da realidade atual que assola a todos e que portanto
deve ser levada a sério pelas autoridades competentes no sentido de realizar de
forma efetiva as mudanças necessárias para tentar acabar como o território sem
lei instalado no universo virtual.
V- Bibliografia
CARRION,
Hugo Daniel. Presupuestos para la incriminacion del hacking. [on line]
[capturado em 24 de janeiro de 2001] (<www.alfa-redi>)
Site
Consultado: http://tiny.uasnet.mx/prof/cln/der/silvia/leyint.htm